Como funcionam os Anos 80

05/09/2014 21:15

A moda e os cortes de cabelo eram de gostos duvidosos. Mas a música, o cinema, os videogames e a globalização da cultura pop fazem dos anos 80 uma época nostálgica, até mesmo para quem não vivenciou aqueles tempos. Para os jovens brasileiros, a década trouxe ainda um clima de liberdade, conquistada com o final do período da ditadura militar (1964-1985) e o processo de redemocratização do país.

 

 

B 52s
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O B-52's foi um autêntico representante do visual
e da sonoridade da new wave dos anos 80

 

No campo da música jovem, nunca o rock foi tão diversificado nem se confundiu tanto com o gênero pop, como nos anos 80. Tanto lá fora como aqui. Os sucessos iam do new wave de Talking Heads e B-52’s ao gótico de Siouxsie & The Banshees e The Cure, passando pelo rock alternativo de The Smiths e U2, o eletrônico de New Order e Depeche Mode e o pop-rock brasileiro de Legião Urbana, Paralamas do Sucesso e Titãs. Já a música pop reinava nas vendagens e na parada de sucesso comandada pelos fenômenos Michael Jackson e Madonna.

 

Transformers
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Nostalgia dos anos 80: "Transformers", sucesso televisivo na época, voltou em 2005 desta vez no cinema

No cinema, a hegemonia dos filmes teens rendeu “clássicos” como “Curtindo a Vida Adoidado” (dir. John Hughes, 1986) e “A Garota de Rosa-Shocking” (dir. Howard Deutch, 1986), além das seqüências arrasa-quarteirões de Indiana Jones, “Guerra nas Estrelas” e “De Volta para o Futuro”. Apesar dos sucessos do cinema, o entretenimento nos anos 80 foi cada vez mais para dentro das residências. Graças à popularização da tecnologia digital, com os CDs, os videocassetes, os computadores pessoais e os videogames, que iniciaram uma nova era e uma nova tendência da cultura jovem.

Mas nem tudo foi diversão. O avanço da Aids potencializou preconceitos e intolerâncias, a ascensão de uma mentalidade ultraliberal na economia foi comandada pelos governos conservadores de Ronald Reagan nos EUA e Margaret Thatcher no Reino Unido e a Guerra Fria manteve a paranóia do holocausto nuclear. A juventude passou a ser um valor dominante e todos saíram em busca dela. Parte dos adolescentes aderiu aos princípios da “geração saúde” e muitos dos adultos passaram a tentar aparentar e se comportar como jovens.

Conheça nas páginas a seguir um pouco mais sobre a cultura e o comportamento jovem nos anos 80.

 

 

 

De volta aos anos 80

Para tentar reviver as emoções e o clima dos anos 80, há toda uma produção cultural nostálgica. Do retorno e relançamento de grupos musicais (The Police, Capital Inicial, Ira!) à transformação em filme de séries televisivas (Miami Vice, Transformers), que fizeram sucesso naqueles tempos, a nostalgia pela década de 80 atingiu também aos mais jovens, pessoas que sequer tinham nascido naquele momento. Nas pistas de clubes noturnos, saudosistas e novas gerações têm dançado ao som de sucessos daquela década, assistido com um interesse antropológico aos primeiros videoclipes da era MTV e tentado se divertir com os videogames “clássicos” do Atari. Visionariamente, o fenômeno da nostalgia pelos anos 80 foi previsto num dos grandes sucessos do cinema da época. O filme “De Volta Para o Futuro 2” (dir. Robert Zemeckis, 1989) traz uma cena em que o personagem interpretado por Michael J. Fox, após viajar no tempo de 1985 para 2015, entra em um bar temático sobre os anos 80, que faz sucesso com objetos daquela década e toca hits oitentistas de Michael Jackson.

 

A música jovem nos anos 80

 

A herança do punk, uma música eletrônica emergente e a ascensão comercial da canção pop foram os ingredientes que levaram a uma diversidade de estilos inédita na história da música jovem. No rock, a fase pós-punk trouxe a modernidade da new wave, um dançante rock eletrônico e novas variações do heavy metal, que iam do melódico aos rápidos riffs de guitarras do trash metal.

 

 

Madonna
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Madonna virou um dos fenômenos da cultura pop
nos anos 80 com sucessos como "Like a Virgin" e "Material Girl"

 

No estilo pop, uma versão mais adocicada e suave do rock, Michael Jackson e Madonna reinaram. Seus sucessos traziam a influência da black music, da nascente cultura hip hop, ecos da disco music do final dos anos 70 e uma pitada de rock também. Aliás, a aproximação entre pop e rock ficou evidente em vários estilos de sucesso nos anos 80. A new wave, apesar de ser uma descendente direta do movimento punk, mostrou-se uma versão mais palatável comercialmente. Bandas como Talking Heads, B-52’s, Blondie, The Police e Devo misturaram elementos essenciais do punk com influências de estilos mais sofisticados e dançantes, como reggae, disco music e música eletrônica. Além da new wave, as influências da música eletrônica alcançaram grupos que fizeram um rock mais dançante, como as canções românticas do Duran Duran e Culture Club ou o pop-rock eletrônico de Soft Cell, Depeche Mode e New Order.

 

Pet Shop Boys
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O pop eletrônico do Pet Shop Boys
foi um dos gêneros de sucesso dos anos 80

Mesmo gêneros mais radicais como o hard rock e o heavy metal tiveram uma fase mais pop nos anos 80. Com um som mais “suave”, grupos como Bon Jovi, Van Halen e Poison emplacaram uma mistura de rocks e baladas sentimentais calcados em um visual influenciado pelo glam rock dos anos 70. Distantes da influência pop, outras bandas, como Anthrax e Metallica, radicalizaram para uma sonoridade mais acelerada e pesada.

 

RPM
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O pop-rock brasileiro teve
fenômenos de vendagem
como o grupo RPM

No Brasil, a renovação da música jovem ocupou o espaço da MPB e dos herdeiros da Tropicália, gêneros que há tempos não faziam canções que expressassem a realidade e os sentimentos de boa parte da juventude. Novos grupos inspirados pelas estéticas do pop-rock que faziam sucesso lá fora surgiram em São Paulo, Rio, Brasília, Porto Alegre e Salvador. O clima de redemocratização ajudou nesse processo. Com mais liberdade de expressão e uma atmosfera de renovação cultural, nasceram bandas como Legião Urbana, Titãs, Os Paralamas do Sucesso, Barão Vermelho, Capital Inicial e Ira!, que revelaram novos e talentosos compositores do pop-rock brasileiro como Cazuza, Renato Russo e Arnaldo Antunes.

O sucesso da música jovem dos anos 80 sobreviveu na nostalgia dos adultos que curtiram aquela época ou na curiosidade dos jovens que não a vivenciaram. Mas, o principal mérito daquelas canções, comprovada pelas regravações de músicas e redescoberta de artistas dos anos 80, é que tanto o pop-rock nacional como o internacional produziram um repertório de canções que continuaram a se identificar com o sentimento das gerações que vieram a seguir.

 

 

U2
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U2: uma das bandas que surge nos anos 80 e
manteve-se nas paradas de sucesso nas décadas seguintes

 

 

 

Sucesso garantido

São
várias as vertentes do fenômeno nostálgico pela década de 80. Há o
saudosismo visto em festas promovidas por danceterias que reservam
determinadas noites para tocar os hits da época. Tem uma produção
cultural inovadora carregada de nítidas influências da estética
oitentista. Grupos como Franz Ferdinand, Interpol e Bloc Party,revelam
sonoridades influenciadas por Talking Heads, Joy Division e The Cure.
Mas, há também uma vertente liderada por grandes gravadoras e estúdios
de cinema que procura apostar naquilo que já fez sucesso e que,
provavelmente, trará lucro certo. Daí o relançamento ou o ressuscitar
de bandas que estouraram nos anos 80, mas estavam no ostracismo ou
tinham acabado, e a filmagem de títulos de séries de televisão famosas
na época.

 

 

Anos 80: a era do cinema para adolescentes

Em “Negócio Arriscado” (dir. Paul Brickman, 1983), Tom Cruise interpreta um jovem estudante que aproveita uma viagem dos pais não só para passear no Porsche da família como também para transformar sua casa em um bordel e faturar metade dos rendimentos das garotas de programa. O filme é emblemático dos valores que a década trouxe. Uma juventude mais pragmática e menos ideológica, que faz da busca por sexo e dinheiro um ideal de vida sem nenhum constrangimento.

 

 

De volta para o futuro
Imagem cedida por Amazon.com
A trilogia "De Volta Para o Futuro" dirigida por Robert Zemeckis,
foi um dos grandes sucessos do cinema jovem nos anos 80

 

Além disso, surgia um novo astro do cinema teen. Tom Cruise iria se consagrar definitivamente alguns anos depois como o personagem Maverick em “Top Gun – Ases Indomáveis” (dir. Tony Scott, 1986). Na galeria de imagens clássicas dos anos 80, não pode faltar a do piloto de caça da Marinha norte-americana, com seus óculos escuros e jaqueta de couro, em cima de uma moto Kawasaki Ninja 900. Também não pode faltar na trilha sonora da década o hit “Take My Breath Away”, que é o tema romântico de Maverick e da instrutora Charlotte "Charlie" Blackwood, interpretada por Kelly McGillis.

Outro sucesso que simboliza o espírito da década e mostra a força do cinema teen foi “Curtindo a Vida Adoidado” (dir. John Hughes, 1986). Mathew Broderick interpreta o adolescente Ferrys Bueller, que mata um dia de aula para vivê-lo como se fosse o último de sua vida. A bordo de uma Ferrari anos 60 e acompanhado do melhor amigo e da namorada, o dia de Ferrys é de pura diversão. No mesmo ano, o diretor John Hughes faria outro sucesso do cinema teen: “A Garota de Rosa-Shocking”. A história de uma garota pobre que se apaixona por um jovem rico retratou a moda e o comportamento adolescente da década, com uma trilha sonora que incluía sucessos de New Order e Echo & The Bunnymen.

 

Blade Runner dvd
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"Blade Runner" lançado em 1982
inaugurou uma nova fase da
ficção científica no cinema

A era do cinema para adolescentes que foi os anos 80 trouxe as superproduções de Steven Spielberg, Robert Zemeckis e George Lucas. A saga do arqueólogo, aventureiro e professor nas horas vagas Indiana Jones teve os três primeiros episódios na década: “Os Caçadores da Arca Perdida” (1981), “O Templo da Perdição” (1984) e “A Última Cruzada” (1989). As idas e vindas no tempo de Marty McFly e do cientista Emmett Brown em “De Volta Para o Futuro” aconteceram entre 1985 e 1990. “Guerras nas Estrelas” também ajudou a consolidar a hegemonia do cinema teen na década com as seqüências “O Império Contra-Ataca” (1980) e “O Retorno do Jedi” (1983). No começo da década, dois clássicos de Francis Ford Coppola – “Vidas Sem Rumo” (1982) e “Rumble Fish” (1983) – abordaram os dramas da adolescência e lançaram uma nova geração de jovens atores como Tom Cruise, Ralph Macchio, Emílio Estevez, Matt Dillon, Nicholas Cage e Rob Lowe.

Mas nem só de cinema para adolescentes foi feita a década. Muito pelo contrário. A produção de filmes cultuados pelos estúdios de Hollywood nunca esteve tão em alta. “Blade Runner – O Caçador de Andróides” (dir. Ridley Scott, 1982) mudaria o rumo das ficções científicas nas telonas. O diretor Brian de Palma lançaria dois clássicos do cinema contemporâneo: “Scarface” (1983) e “Os Intocáveis” (1989). A onda dos mangás começaria a conquistar o mundo com a animação meio cibernética meio punk “Akira” (dir. Katsuhiro Otomo, 1988). David Lynch com “Veludo Azul” (1986), Spike Lee com “Faça as Coisas Certas” (1989) e Jim Jarmusch com “Stranger Than Paradise" (1982) e “Down By Law” (1983) mostraram a força de um cinema independente e alternativo aos padrões hollywoodianos.

No Brasil, na onda do novo pop-rock brasileiro surge também um cinema focado no público adolescente. Produções como “Menino do Rio” (dir. Antônio Calmon, 1981) e “Rock Estrela” (dir. Lael Rodrigues, 1986) revelaram o estilo de vida da juventude carioca, embalados pelos sucessos da nova música jovem no país.

Comportamento e moda jovem nos anos 80

 

A ascensão do pop e o renascimento do rock após o punk contribuíram para a propagação de visuais e comportamentos que caracterizariam a década de 80. Os cabelos estilo mullet, usados pelos cantores e músicos, e a predominância na moda das cores cítricas e das ombreiras, derivados da estética da new wave, um dos subgêneros do pop-rock oitentista, são exemplos dessas características visuais que diferenciaram os anos 80, da mesma forma que os topetes com brilhantina, as lambretas e as jaquetas de couro caracterizaram os anos 50.

Com o advento da “geração saúde”, o culto ao corpo e à juventude se tornou uma das manias da época. Não só a cultura das academias de ginástica, mas também o uso de peças de roupas esportivas entraram na moda. A sobreposição de peças no vestuário feminino ganhou as ruas, popularizada principalmente pelo visual de Madonna.

Mas não foi só o visual do jovem que mudou. Logo no começo daquela década, novas tecnologias de comunicação e de entretenimento mudaram estilos de vida e formas de fazer negócios e aproximaram culturas. Essas inovações tecnológicas, junto principalmente com a música, a moda e o cinema, ajudaram a cultura pop a se consolidar como um fenômeno global e dominante a partir dos anos 80.

 

Harrison Ford
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O ator Harrison Ford em cena do filme "Blade Runner": ícones dos anos 80

 

 

Dez ícones dos anos 80

Mullets: corte de cabelo da moda foi usado pelos principais pop stars da década na música e no cinema. Dos integrantes da banda britânica Duran Duran à nova geração de jovens atores que surgiram, o corte de cabelo curto na frente e nos lados e comprido atrás virou uma febre. Inspirado no visual do personagem do glam rock Ziggy Stardust de David Bowie dos anos 70, o mullet virou moda e se tornou umas das marcas registradas dos anos 80.

Miami Vice: o seriado inovou ao mostrar consumo e tráfico de drogas, badalação, violência, sensualidade e um novo tipo de policial, elegante e que andava de Ferrari pelas ruas de Miami. O sucesso da dupla de detetives Sonny Crocket e Ricardo Rico, interpretados pelos atores Don Johnson e Philip Michael Thomas, foi de 1984 a 1990. Em 2006, o diretor Michael Mann fez uma versão para o cinema que atualizou as aventuras e a atmosfera da época.

Harrison Ford: ele foi o ator principal de alguns dos mais importantes filmes da década. Para começar fez o papel de Indiana Jones, o mais famoso arqueólogo da história do cinema. Participou também como um dos protagonistas da saga espacial de “Guerra nas Estrelas” como o sarcástico Hans Solo. Simbolizou a revolução nas ficções científicas como o caçador de andróides em “Blade Runner”. Como se não bastasse, estreou outros sucessos da década como “Busca Frenética” (dir. Roman Polanski, 1988), “Uma Secretária de Futuro” (dir. Mike Nichols, 1988) e “A Testemunha” (dir. Peter Weir, 1985).

Legião Urbana: o grupo tendo o compositor e vocalista Renato Russo à frente foi uma das melhores bandas do pop-rock brasileiro dos anos 80 e deixou como legado uma série de canções que viraram clássicos para várias gerações. O poder de expressar os sentimentos da juventude está presente em sucessos como “Será”, “Tempo Perdido”, “Eu Sei”, “Há Tempos”, “Pais e Filhos” e “Meninos e Meninas”, entre outros.

Atari: um dos videogames pioneiros chegou oficialmente ao Brasil em 1983, seis anos pós ser lançado nos Estados Unidos. Com seus jogos “clássicos” como “Space Invaders”, “Donkey Kong”, “Defender” e “Mario Bros” virou uma mania e é um dos itens mais cultuados pelos saudosos dos anos 80.

The Smiths: o grupo britânico da fase pós-punk teve uma curta existência (1982 a 1987), mas um sucesso enorme e duradouro. Com versos que revelaram Steven Morrissey como um dos mais sensíveis e brilhantes letristas da canção pop e uma música inovadora e dançante, o grupo se firmou no panteão das melhores bandas de todos os tempos, graças a canções como “There Is a Light That Never Goes Out”, “How Soon Is Now” e “This Charming Man”.

De Volta Para o Futuro: a trilogia que tornou Michael J. Fox um astro, no papel do adolescente Marty McFly que viaja para o passado e para o futuro na tentativa de melhorar sua família, é uma coletânea de símbolos dos anos 80: da moda dos tênis Nike ao carro DeLorean DMC-12, da onda do skate ao sucesso da canção “Power of Love”, de Huey Lewis and The News.

New Wave: o gênero nasceu no final dos anos 70 como uma versão mais palatável musical e visualmente do punk. Mas é no começo dos anos 80 que a moda “new wave” toma conta do gosto de parte dos jovens brasileiros. As primeiras bandas do novo pop-rock nacional exploraram os fundamentos estéticos da new wave tanto em suas canções como em suas performances. Bandas como Blitz, Titãs, Gang 90 e Absurdettes, Magazine e Kid Abelha & OS Abóboras Selvagens, entre outros, foram exemplos disso.

Boy Bands: apesar de existirem desde os primórdios da canção pop, foi nos anos 80 que houve uma explosão de boy bands, grupos vocais com visual caprichado, canções grudentas e talento discutível. Na safra oitentista estavam Menudos, New Kids on The Block, Polegar e Dominó.

He-Man: os desenhos animados ganharam novas linguagens na década de 80, como o desenho dos personagens animados sobre o movimento de atores de verdade. Entre os principais sucessos da animação na televisão estavam “He-Man e os Defensores do Universo”, um super-herói que vive num mundo mágico, meio medieval meio futurístico, que enfrenta o vilão Esqueleto para proteger o castelo de Grayskull. “Thundercats”, "Transformers" e “Comandos em Ação” foram outros desenhos de sucesso da época.